Meu Newton 100 jamais foi o mesmo.
Donald Norman talvez seja um dos pensadores que mais influenciou a experiência de uso dos produtos tecnológicos que fazem parte do nosso dia a dia. Há anos, o americano é pesquisador e professor de um assunto que virou moda recentemente – ciências cognitivas. Como todo cara que faz diferença, Norman realiza a fusão das ciências cognitivas com outros ecossistemas, como usabilidade e tecnologia.
É leitura básica para quem lida com a gestão de produtos de tecnologia.
As teorias de Norman vieram à tona com o lançamento do iPhone 5, da Apple.
Segundo o pesquisador, todo produto tecnológico tem um ciclo de vida – nascimento, adolescência e maturidade (Geoffrey Moore tem uma tese parecida em Crossing the Chasm).
Na fase do nascimento, a tecnologia é o principal fator de sucesso e de diferenciação no mercado. Ela tem o papel principal. Usabilidade ruim e pouca conveniência são minimizadas. A tecnologia é cara e escassa e o que importa é funcionar mesmo que minimamente. Nesta fase inicial, os principais consumidores são os chamados “early adopters”.
No período da maturidade, a tecnologia passa a entrar como pano de fundo. Aspectos não-tecnológicos, como processo de serviços, conveniência, marketing e criação de ecossistemas, passam a ser bem mais importantes. Neste período, tecnologia vira commodity. Torna-se invisível. E a categoria de pessoa que a compra também muda.
Não é à toa que, na maioria das vezes, o mundo não segue necessariamente a melhor tecnologia, mas sim quem cria o melhor ecossistema estratégico. Aliás, quem evidencia isso não é exatamente Norman, mas a própria história do mercado de tecnologia. Se ter a melhor tecnologia garantisse domínio de mercado, teríamos utilizado fitas Betamax em vez de VHS, e nos computadores pessoais, teríamos tido muito mais Mac OS X embutidos do que DOS.
Essa análise de Norman sobre os ciclos de vida traz perspectivas não somente para setores de marketing, negócios e desenvolvimento do mercado móvel, mas igualmente para o próprio setor que cobre os lançamentos desses produtos.
É engraçado ver blogs de tecnologias discutindo e comparando qual celular tem tal tecnologia, qual produto tem processador feito disso e daquilo. Para tentar diferenciar os produtos, são criadas até métricas, como o tamanho do parafuso que conecta a parte traseira ao leitor da tela… Parece papo de mecânico.Público de massa mais preocupado com conveniência, imagem e facilidade passa a ocupar mais espaço no mercado.
Questões bem mais importantes, não-tecnológicas, e que geram diferenciação, tais como o ecossistema estratégico criado em torno do produto, a dinâmica do processo de serviço oferecido ou o que as pessoas podem fazer com a tecnologia, ficam de lado da maioria dos reviews. É como se o mercado de smartphone ainda estivesse naquele primeiro ciclo de Norman, em que a tecnologia é o fator principal para um produto ser campeão.
Ao que tudo indica, estamos numa nova fase.
Com o lançamento do iPhone 5 acompanhado do Galaxy S III, da Samsung, as diferenças no mercado de smartphone ficaram menores. A indústria está chegando mais ou menos a um consenso sobre o tamanho das telas dos smartphones. As interfaces estão cada vez mais parecidas. Touchscreen era diferencial, virou commodity.
Cada vez menos, a tecnologia tem se tornado o diferencial no mercado de smartphone. E, cada vez mais, aspectos não tecnológicos, como, por exemplo, ter o ecossistema mais robusto, passam a ter relevância.
Não é sem motivos que o iPhone 5 está batendo recordes de venda, apesar de ter especificações técnicas inferiores aos concorrentes.
Quantas vezes você não ouviu alguém falar que tal smartphone é melhor que o iPhone até o momento que tenha que usar os serviços de suporte (pós-venda) de tal empresa que produz o celular concorrente ao da Apple?
As teorias de Norman a respeito dos ciclos de vida ajudam a responder à pergunta que, após o lançamento do iPhone 5, ganhou destaque em diversos sites especializados – a Apple continuará firme no mercado? Se os conceitos do pesquisador estiveram corretos, a Apple continuará crescendo ainda por um bom tempo tanto do ponto de vista de participação de mercado como de “mind share”.
É a empresa no mercado de smartphones que até agora criou o melhor ecossistema estratégico em torno dela, entendeu que marketing e serviços (um bom pós-venda) têm um valor crucial. Enfim, percebeu que aspectos não-tecnológicos podem ter uma relevância bem maior do que os tecnológicos, indicando uma maturidade do mercado.
por http://www.tiagodoria.com.br/coluna/tag/apple/